quarta-feira, 4 de setembro de 2013

O CORE E O CIRCO NAS ACADEMIAS - atualidades científicas - PARTE 1 - Prof Denilson Costa

INTRODUÇÃO


A maneira "ideal" de se treinar o "core" passou a ser alvo de discussão nos últimos anos.. O abdômen, o transverso, oblíquos, eretores e quadrado lombar, trabalham em conjunto formando um cinturão que mantém o tronco estabilizado e nos permitem que andemos eretos.

Os exercícios mais populares sempre envolveram flexionar ou estender a espinha isoladamente, com a intenção de tirar de jogada o psoas e glúteos/ísquios. Me refiro aos "crunches" e máquinas de extensão lombar. O questionamento que começou a ser feito já na ultima década, é que: Se esses músculos fazem o possível para nos mantermos "eretos", por que razão deveríamos treiná-los em máquinas utilizando justamente o padrão flexão/extensão para o qual eles opõe resistência quando trabalham em conjunto?

A resposta que tive cara a cara por um especialista em biomecânica foi que:

"exercícios em isometria não promovem o deslizamento de actina e miosina, e com isso não proporcionam desenvolvimento muscular significativo"... (?)

E então.... a cruzada do treinamento funcional invadiu o mercado do fitness! O circo chegou as academias! Não, eu não tenho nada contra o circo. No Cirque Di Solei por exemplo temos belíssimos números de domínio corporal, executados na verdade por muitos ex atletas! O problema é que esse mercado sempre foi avesso a barras, halteres, calos nas mãos, gente forte e levantamento de peso! A solução foram as bolas suíssas, os bosus, etc. Estava tudo dentro do aceitável, até que alguém teve a idéia infeliz de colocar gente pra levantar peso em cima desses implementos. 

Tem um ditado la fora que diz algo assim: “You cant shoot a Canon from a canoe”.. Algo do tipo: “Você não pode disparar um canhão de cima de uma canoa”. Por que? Simplesmente porque sem peso, estabilidade e fixação, o disparo da arma arremessaria a canoa para longe, junto com o tiro!


                     ...segundo Sir Isaac Newton....  VAI DAR MEEEEEEEEEEEEERDAAA !!!
                                 (Imagens dos próximos candidatos ao "vídeo cacetada")

O treinamento contra resistência é feito para aumentar a FORÇA em todos seus níveis de manifestação, e se você não tiver estabilidade NENHUMA, você estará sobre uma canoa (bozus, bolas suíssas, etc.), não vai conseguir gerar níveis consideráveis de força para disparar o seu canhão (barras, halteres, kettlebells)! Simples assim!

Não existe nada de errado em utilizar esse implementos em treinamento, apenas não levante peso sobre eles, e antes de considerá-los uma panacéia, observe se o tipo de esporte que você pratica, realmente pode ou não se beneficiar de treinamento em superfícies instáveis.

Alguma dúvida de que este "CORE" esta plenamente ativado, desenvolvido, e que dispensa bolas suíssas e bosus ?

TREINAMENTO ISOLADO DOS EXTENSORES DO TRONCO


Ainda nos anos 80, o único cara que escrevia de maneira organizada e publicava livros sobre powerlifting era o Dr Squat, apelido dado ao PhD Frederick Hatfield. Fred escrevia para famosa revista americana Muscles&Fitness dos Weider, e ao contrario dos acadêmicos de ontem e hoje, era ATLETA, na verdade recordista mundial de agachamento, fazendo mais de 400kg aos 45 anos de idade!

Dr Squat acreditava que o método bodybuilding, que envolvia o trabalho relativamente isolado dos músculos, constituía uma ótima fundamentação de base para powerlifters em offseason. Um de seus exercícios preferidos eram os “back raises”, que segundo ele eram executados por Vasili Alexeiev na Rússia com enormes cargas! Antes de realizar levantamento terra e agachamento em estilo competitivo, o atleta deveria tornar seus eretores fortes como aço com esse movimento. Eu usei parte dessas idéias na publicação de uma revisão sobre treinamento de força para lombalgia.

                                                         Doctor Squat em ação !!!

Nessa mesma época, Pollock e colaboradoes se envolveram no projeto MedEx. Uma cara máquina que estabilizava o quadril e travava as pernas na posição sentado. Dessa forma era possível que os extensores fossem trabalhados sem nenhuma ação dos glúteos e ísquios, associada a extensão do quadril. Eles e outros pesquisadores foram além, dizendo que somente nessa máquina, seria possível um trabalho isolado e com isso adequado, aos eretores do tronco. A principal alegação era que em bancos de extensão, (também chamados de hiperextensão) os glúteos e ísquios terminariam por gerar mais força que os eretores, prejudicando o seu desenvolvimento!


... sem acesso a uma dessas caras máquinas, os paravertebrais jamais seriam adequadamente treinados? hummm.. difícil de engolir...

Alguns anos mais tarde o pesquisador Stewart McGill apontaria alguns problemas com essa abordagem isolada aos eretores, que envolve a flexão e a extensão da coluna vertebral. McGill é para as costas, o mesmo que Rafael Escamilla é para o agachamento e os joelhos! O principal perigo segundo ele, seriam as elevadas forças de compressão nos discos intervertebrais, capazes de gerar hérnias discais, observadas até em seu laboratório!


O CORE


O trabalho de McGill parece ter servido de base pra muita gente que não gosta de fazer força, e adora o “fru fru” das ultimas modinhas do fitness. Ironicamente, poucos sabem que esse cara estudou diretamente powerlifters, o levantamento terra, e até mesmo kettlebells! 

Recentemente o valor de “fru fru” >>......................................................... <<  (Insira nessa linha boa parte do arsenal de exercícios “core funcionais” que você já ouviu falar) foi duramente questionado, numa comparação com exercícios como o agachamento e o levantamento terra. Vejam as conclusões de MARTUSCELLO et AL, no artigo abaixo traduzido :



SYSTEMATIC REVIEW OF CORE MUSCLE ACTIVITY DURING PHYSICAL FITNESS EXERCISES - 2013


.... "O objetivo desse artigo foi rever sistematicamente o que existe na atualidade em pesquisa, sobre a atividade elétrica (EMG) de 3 músculos do “CORE” (multifido lombar, transverso do abdômen e quadrado lombar) durante o exercício. Um achado importante foi que existem relativamente poucos estudos sobre a atividade elétrica do multifido lombar e do transverso do abdômen, e nenhum estudo avaliou a atividade elétrica do quadrado lombar.

As conclusões dessa revisão sistemática indicam que a atividade elétrica do multifido lombar é maior durante exercícios com pesos livres se comparado a outros tipos de exercício. Esse achado implica que, treinadores e personal trainers, devem promover o uso de exercícios multi articulares, com pesos livres, ao invés de movimentos sobre bolas e outros implementos, para otimizar a atividade elétrica (EMG) do multífido lombar

As possíveis explicações para maior atividade elétrica do multifido durante exercícios com pesos livres incluem o uso de carga externa, e a utilização de movimentos que utilizam todo o corpo, ao invés de exercícios isolados para recrutar o CORE.

 As evidencias verificadas nessa revisão sugerem que a atividade elétrica do multífido é similar entre exercícios realizados sobre bolas ou implementos, e  aqueles realizados no chão, não sendo possível dessa forma elaborar conclusões sobre o mérito dos implementos versus exercícios CORE tradicionais.

As conclusões dessa revisão indicam que exercícios com pesos livres como o agachamento e o levantamento terra, são ótimos para produzir atividade elétrica do multífido lombar, e não parecem haver exercícios melhores que outros em relação ao recrutamento do transverso do abdômen. Acrescentar exercícios específicos para o CORE, para suplementar uma rotina de treinamento construída em cima de exercícios com pesos livres é provavelmente desnecessário para ativar esses músculos. Dessa forma, treinadores e personal trainers devem focar na prescrição de exercícios multi articulares com pesos livres, ao invés de movimentos específicos para o “CORE”, para de fato treinar o CORE de clientes e atletas.

Tipicamente, exercícios com pesos livres são movimentos multi articulares que utilizam carga externa. Executados dessa maneira, em conjunto a  aplicação de sobrecarga progressiva, os pesos livres estão associados a múltiplos benefícios para saúde e para aptidão física., como  melhora na composição corporal, aumento da força, aumento da densidade mineral óssea e da saúde cardiovascular. Nenhum desses benefícios tem sido associado aos exercícios de CORE no solo (exercícios estabilidade ou tradicionais) ou sobre bolas e implementos. Adicionalmente, em contraste aos exercícios para CORE, os exercícios com pesos livres ativam simultaneamente grandes grupamentos musculares que atuam sobre vários sistemas articulares. Dessa maneira, treinadores e personal trainers perceberão que o uso desses exercícios; também associados a inúmeros benefícios a saúde, representa um uso mais eficiente do tempo, que a prescrição de inúmeros exercícios para o CORE. Adicionalmente, a sobrecarga com exercícios em pesos livres pode ser continuamente incrementada, a medida que os músculos se tornam mais fortes ao longo da aplicação do programa de treinamento, enquanto que com os exercícios para o CORE, no solo ou sobre implementos, esta tipicamente limitada ao peso corporal.
  

Os achados dessa revisão também indicam que utilizar bolas ou implementos nos exercícios de CORE tradicionais de solo, não aumentam a atividade do multífido lombar ou do transverso do abdômen. Dessa maneira, devido a simplicidade dos exercícios de solo, acrescentar bolas e implementos parece ser desnecessário e não recomendado.".....

... e advinhem quais foram nessa revisão, os exercícios com pesos livres que superaram o “malabarismo funcional” na ativação do CORE ?



AGACHAMENTO

LEVANTAMENTO TERRA

terça-feira, 20 de agosto de 2013

TERRA "STIFFADO" ? por Denilson Costa


Um grande amigo esteve em minha academia a alguns meses, fazendo um treino de levantamento terra. Eu dei algumas sugestões, fizemos filmagens, e abaixo segue algumas aplicações dessas idéias:

"...meu terra pesado é beeeem stiffado, e eu tento sim "tirar a barra do chão, não arrancar a barra do chão". Creio que porque minha cadeia posterior é MUITO mais forte que meu quadríceps. Além disso , forçar uma posição de saída mais baixa e (tentar) tirar o peso daí é bem doloroso nas minhas patelas. Percebi no meu caso que se eu conseguir manter a cabeça numa posição neutra ( ao invés de olhar pra cima), meu lombar se curva menos, mas o movimento permanece stiffado. Tenho trabalhado nisso fazendo terra em déficits de 2 a 5 cm ( pra forçar uma saída mais baixa e TENTAR usar mais as pernas), agachamento com barra alta no estilo "olímpico", terra com pegada de snatch, e mais uma coisa ou outra que não me lembro agora. Pelo seguinte: será que , aumentando a força do quadríceps, não conseguiria maior carga no terra , usando uma "técnica correta"? Outra coisa: é tão ruim assim um terra stiffado se o sujeito que assim o faz está favorecendo suas alavancas mais fortes, e usando uma posição mais confortável( por ser menos dolorosa)?..."




Eu tenho minhas dúvidas se o problema é o quadríceps ou o glúteo, mas seja la quem for, você escolheu o caminho certo: A técnica na "maior parte" dos atletas avançados só vai mudar com mudanças no equilíbrio de forças!

Nada errado com terra stiffado, o objetivo do esporte é levantar o máximo de peso! Use sua melhor alavanca para isso! Não me surpreende a dor na patela quando se flexiona o joelho a 90 graus parando na posição. Os 90 são a amplitude de maior compressão patelo femoral em cadeia cinética fechada!

Curiosamente quando tem alguma coisa inflamada ou meio fora do lugar (aparente compressão nervosa) na minha lombar, a postura stiffada causa muito menos desconforto e compressão...

Nem a "biomecânica ocupacional" conseguiu um consenso sobre maior segurança entre a técnica "agachada" ou "stiffada" em relação a lesões no ambiente de trabalho. A técnica "agachada" aumenta a percepção de esforço em trabalhadores, aparentemente produzindo menor eficiência quando o objetivo é repetir a tarefa ao longo de várias horas. O "Girevoy Sport" na Rússia, tem o kettlebell executado por 10 minutos ininterruptos em postura stiffada pela mesma razão !!! ECONOMIA !


O "nome" quando se fala em coluna na atualidade é McGill. Suas pontuações tem se espalhado em vários posicionamentos. Esse cara analisou a coluna de powerlifters durante terras pesados , e viu que a maioria curva suas colunas dentro de limites fisiológicos, parando 2 a 3 graus antes do limite máximo de cada vértebra. Se uma dessas vértebras excede esse limite, voce se machuca! ( e ele conseguiu registrar uma lesão ao vivo em laboratório ). Segundo McGill, os mecanismos comuns para lesão séria (hérnia) são flexão + rotação; compressão + flexão.

O terra começa de baixo, tendo em maior componente a força de cisalhamento devido a flexão (tendência de uma vértebra deslizar sobre a outra). A medida que a barra sobe, aumenta o componente de compressão. Para tornar a coisa mais segura, a maior parte dos atletas avançados instintivamente tenta manter a lombar o mais reta quanto possível, enquanto permite a curvatura na coluna torácica. Isso faz todo sentido, uma vez que raramente se ouve falar de hernias torácicas. A coisa normalmente é L5 - S1...



Isso faz todo sentido também porque uma coluna em "C" é mais curta, e oferece um menor braço de resistência que uma coluna totalmente reta. Muitas pessoas ainda não entenderam que a postura "olímpica", atende as necessidades de levantadores olímpicos, que é ACELERAR a barra por uma DISTANCIA muito mais longa que a nossa, e com isso ter TEMPO de entrar embaixo da mesma... É por essa razão que a combinação de tronco longo e braços mais curtos pode ser perfeita no LPO, enquanto o oposto é o ideal no POWERLIFTING.


Continuando com a coluna em "C", observamos que grandes nomes como Konstantin Konstantinov e mesmo Andy Bolton, permitem a flexão na coluna torácica; KK de maneira bem acentuada! Por que razão, vocês podem perguntar... É simples: Todos sabem que braços longos e tronco curto é a combinação ideal pro levantamento terra. Quando o atleta RELAXA OMBROS E TRAPÉZIOS, ele torna seus braços artificialmente mais longos, simples assim! Se ele além disso, ele curvar a região torácica, o tronco já vai sair do chão bem mais alto e distante da barra! Por isso meus caros NUNCA ADUZAM AS ESCAPULAS PRA FAZER LEVANTAMENTO TERRA... Principalmente no estilo convencional. Fazer isso só vai trazer teu tronco mais para baixo em direção a barra, e com isso aumentar o esforço dos eretores da coluna...

Recentemente descobri que não estava sozinho nessa minha observação:

“Existe um grande debate entre treinadores e atletas sobre a posição inicial do terra. O foco tem sido particularmente em retrair ou não as escapulas no inicio do movimento, alguns dizem que sim, outros dizem que não. Eu não faço isso, e não permito que nenhum dos meus alunos retraia a escapula também! Ao invés disso, eu ensino a arquear a região lombar, enquanto RELAXAM, a coluna torácica e os ombros! Isso provoca a redução da amplitude de movimento, o que é importante se você deseja atingir o seu potencial de força no terra. De qualquer maneira, não há como manter os ombros retraídos quando você fica realmente forte no levantamento. Eu não consigo lembrar de nenhum atleta top que retraia as escápulas antes de puxar um terra”.

Quem disse isso foi ninguém menos que Andy Bolton, conhecem? Ele puxou uns  pesinhos, vejam:



CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES SOBRE TERRA “STIFFADO”


O termo “stiffado” não deve ser interpretado literalmente. Ele deve caracterizar uma puxada feita com a saída mais alta, apenas isso! Não convém por exemplo que o movimento aconteça em 2 tempos, terminando com joelhos totalmente estendidos antes que o quadril consiga colocar o tronco ereto !!!! Nesse caso, a musculatura eretora pode entrar na chamada zona de “apagão” neural, onde cessa a sua atividade e a carga é entregue à sorte dos ligamentos, discos e vértebras...

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

HEX BAR - TRAP BAR,,, primeiras impressões... Prof Denilson Costa

A primeira coisa a dizer é que com essa barra você pode ter sempre a desculpa de que só não levantou mais peso porque não cabia...

Esse treino foi no último final de semana, na academia WORKOUT em Copacabana (RJ-Brasil), junto aos amigos da equipe Seth Power. Desde já agradecendo ao convite de Leonardo Primata e André Jenz, e aos proprietários da WORKOUT que tem aberto as portas para o POWERLIFTING. ( A WORKOUT, junto com a RADAR, já são pontos de referencia no Rio de Janeiro para o Bodybuilding e gente que treina sério e não ta afim de ouvir "professor" falando em exercício "contra-indicado"...)


O QUE ESPERAR DESSA BARRA ?


Bem, eu estava curioso, e a primeira impressão é que ela pode ser uma ótima ferramenta para que o levantador descubra como usar suas pernas no levantamento terra; particularmente no estilo convencional, onde muitos atletas acabam adotando uma postura apelidada de "stiffada", devido a elevarem o quadril e puxarem a carga na postura do "stiff legged deadlift" (apelidado aqui de peso morto também).

Cheguei a observar 2 atletas que treinavam comigo antes da sessão de "4 horas combo" iniciar (Terra + agachamento+supino+kettlebell+desenvolvimento). A menina levantava em postura olímpica, e o rapaz usava um bocado do lombar.

A barra; como podem observar no vídeo, passa longe das "canelas". Isso quer dizer que sobra espaço para agachar e tentar usar as pernas...  Se o atleta não consegue isso nem com essa barra... é sinal de que lhe faltam pernas, e nesse caso, é inútil o grito dos puristas de "abaixe o quadril",, uma vez que sob cargas máximas, a técnica utilizada vai ser sempre o resultado INSTINTIVO das alavancas que possuam maior vantagem momentânea...   Em outras palavras: Se o seu levantamento terra incomoda aos outros ou a você mesmo por parecer um "bom dia", a solução pode não ser tão simples como apenas "abaixe o quadril", mas sim um trabalho de longo prazo para desenvolver grupos musculares mais fracos...

De qualquer maneira, não fique triste se após alguns meses o seu terra ainda parecer um "bom dia", um "stiff" ou whatafuck,, alguns dos terras mais pesados de todos os tempos realmente foram feitos em bizarras distorções do estilo convencional. Quem sabe você não seja um deles ? ;)



domingo, 27 de janeiro de 2013

Sumo ou convencional ? Qual o melhor estilo de levantamento terra? Prof Denilson Costa



Na verdade, eu pretendia apenas responder a uma postagem  numa página do face, mas após esbarrar em alguma obscura tecla do minúsculo teclado de meu netbook, a pagina pulou, jogando fora meus 5  parágrafos sobre o tema... Sim, eu fiquei bastante irritado!
Sublimei a raiva, e dividido entre o desejo de dormir ou de atirar o netbook pela janela, decidi então postar no blog...

Voltando ao facebook : Uma foto apresentava, Ed Coan realizando um terra no estilo Sumo, ao lado de Andy Bolton no estilo convencional. Acima da foto havia a pergunta: QUAL O MAIS TÉCNICO?
Como na foto haviam 2 , a questão poderia ser tanto sobre qual dos  atletas era mais técnico como levantador, quanto sobre qual dos dois estilos era mais técnico, ou seja, o estilo sumo executado por Ed Coan ou o convencional (clássico) executado por Andy Bolton. Quando em levantamento de peso, usamos a palavra técnica posteriormente ao advérbio MAIS, obviamente nos referimos a um movimento onde houve muito mais precisão, frieza, timing, do que adrenalina, explosão ou raiva...

Observei os comentários antes de responder, pra saber que rumo tomava a discussão, e uma das postagens me chamou a atenção:

...O VERDADEIRO DEADLIFTING é O CLASSICO, O CONVENCIONAL MESMO. ALI ONDE O ATLETA TEM MAIS DIFICULDADE, POR SER UM MOVIMENTO MUITO MAIS ALTO. SENDO ASSIM O ATLETA TEM MAIS DIFICULDADE EM SUBIR A BARRA, E ASSIM TRABALHA MUITO MAIS A SUA FORÇA....






Do ponto de vista da física simples, a afirmação esta correta, uma vez que a fórmula para trabalho (W) é: W= F x D (força X distancia). Dessa forma, quanto mais longo o percurso de aplicação de uma força, mais trabalho está sendo gerado.

Os desdobramentos do conceito acima são a princípio bem simples: Um atleta com 187cm de estatura realizando um levantamento terra convencional  com 300kg, estará realizando mais trabalho do que outro atleta com apenas 165cm, devido ao percurso mais longo de subida da barra. Essa no entanto, é uma análise cinemática, feita a olho nu, observando apenas a geometria e percurso do movimento.

O que acontece dentro de nossos corpos; ou seja, como essas forças se comportam e são produzidas, precisa ser medido osso por osso, levando em consideração músculos e alavancas. Isso faz parte de uma outra divisão da biomecânica chamada cinética, e tem desdobramentos muito mais complexos do que simplesmente dizer que” alguém” só levanta mais peso porque faz um movimento mais curto...

Não, eu não domino cinética, cinemática ou biomecânica, mas uns 20 anos de powerlifting somados a alguns conhecimentos básicos de educação física, fazem com que você consiga entender muito melhor o que se passa em seu próprio corpo.



ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A TEORIA: “MOVIMENTO MAIS CURTO DA PRA LEVANTAR MAIS PESO”



Andy Bolton: 183cm, 160kg, 457,5kg de levantamento terra

Benedikt Magnusson: 183cm, 171kg, 460kg de levantamento terra

Konstantin Konstantinov: 193cm, 140kg, 426kg e levantamento terra
Fonte: Wikipedia



Comparem as marcas acima com a relação, peso corporal, estatura, e marcas das categorias mais leves:

Média de estatura de levantadores até 52kg – 148 a 162cm


Recorde mundial:
Sajeeva Bhaskaran (India) 1993 (260.0 kg.) (India Nationals) (IPF)


Média de estatura de levantadores até 75kg – 164 a 170cm


Recorde mundial: 
Oleksandr Kutcher (Ukraine) 2006 (360.0 kg,) (Columbus, Ohio) (WPO)

Fontes: Strenght and Power in Sport- Paavo Komi, 1991. http://www.powerliftingwatch.com/records


... e a pergunta (as...) que não quer calar:



Se atletas com menos de 160cm possuem alguma vantagem por produzir um levantamento mais curto, por que razão os recordes mundiais em peso absoluto estão nas mãos de atletas com mais de 180cm ? Cadê a tal vantagem mecânica?

Pra bagunçar logo o negócio, por que os anões (e existem vários deles competindo no powerlifting) não são os atletas mais fortes do mundo ?

Falarei a seguir sobre SUMO, e deixo para todos aqueles que exaltam a “pureza” e “legitimidade” do levantamento terra convencional, a missão de responder as questões acima...



LEVANTAMENTO SUMO E AMPLITUDE DE MOVIMENTO

Uma pequena parte dos “puristas” do peso espalhados pelo mundo, tem algumas estranhas convicções que são as vezes muito mais filosóficas do que práticas; embora pertinentes, mas em outras dezenas de vezes, puro reflexo de um orgulho ferido: seja por uma performance atlética muito abaixo da média, ou por uma carreira esportiva que nunca decolou. São os atletas que ninguém nunca viu competir; treinadores que nunca treinaram ninguém; escritores que nunca vivenciaram aquilo de que falam em seus livros! É claro que eu não coloco todo mundo nessa posição, incluindo o amigo que emitiu numa boa, uma opinião pessoal sobre o levantamento terra!

Um atleta de ponta, detentor de recordes mundiais, que ganha DINHEIRO com o esporte, seja através de bolsa, patrocínio, prêmios em grana, ou mesmo cursos, livros, workshops e uso de sua imagem, já deixou a muito tempo de ser “purista”. E digo mais, muitos atletas só chegam ao status de excelência justamente após romper com toda essa ética hipócrita e mentirosa de nossa sociedade! Esteroides, estimulantes, betabloqueadores, diuréticos, eritropoietina, e etc. Estou mentindo? A cada 2 ou 3 anos explode alguma bomba na mídia, a última foi Lance Armstrong, 7 vezes campeão da Tour de France, o “Mr Olympia” do ciclismo...

Powerlifting tem muito menos retorno financeiro que os esportes mainstream, isso pode gerar 2 tipos de comportamento: o atleta liga o foda-se e se dopa como louco por não ter nada tão valioso a perder, ou, o atleta é muito mais comedido com o doping (comedido não quer dizer puro), pois sabe que não vale a pena arriscar sua saúde cometendo excessos para um retorno muito pequeno... Eu sou tendencioso por ser levantador, e acredito na segunda hipótese para o nosso grupo.

A questão é, se os atletas fazem todo tipo de coisa para alcançar maiores resultados e vitórias; incluindo o doping, por que razão os animais que possuem os terras mais pesados do mundo não levantam no estilo sumo para brigarem entre si?

Alguém aqui acha que o Andy Bolton teria qualquer problema de consciência pra adotar o sumo e recuperar seu record batido por B. Magnusson? Konstantinov, mais alto dos 3, estaria com 20 centímetros de desvantagem devido a sua maior estatura (183 x 193cm)...  Será que ele teria um movimento 20cm mais curto se adotasse o sumo, e colocaria 20, 30, ou 40kg a mais na barra por isso?

Será que os 3 atletas são “puristas” adeptos da “única forma legítima, ética, e politicamente correta de se realizar o levantamento terra”?   Ou será que após mais de uma década de carreira nos esportes de força, perceberam que suas estruturas simplesmente não são ideais para o sumo?



EFICIÊNCIA DE FORÇA   x  MÁXIMA PRODUÇÃO DE FORÇA


Li algo sobre eficiência em algum canto, algo que eu nunca havia pensado. Eficiência não é um meio de se obter o maior resultado, mas sim a forma mais econômica de produzir “algum” resultado. Um sistema eficiente consegue o máximo de produção com o mínimo dispêndio de material e energia. O que esse mesmo sistema poderia produzir no entanto, com uma abundancia de energia e de material?  No mínimo mais, ou,,,, quem sabe,,,, muito mais produção! Você deseja o máximo de resultados ou o máximo em eficiência?

Faça uma experiência, adote o estilo sumo e veja se vai levantar 10, 20, ou 30kg a mais por isso... Caso negativo, toda essa eficiência, esse percurso mais curto, não valeu de nada! A única razão pra você não tentar, é não ligar pra medalha, e se você não liga, arrume algo melhor pra fazer do que ir aos campeonatos ué...


Um movimento mais curto, pode sim ser um movimento mais econômico ou eficiente, mas não necessariamente mais forte!

Dúvidas?

Levantadores realizam duas provas, o arranco e o arremesso. No último, embora a pegada seja mais fechada, os atletas terminam com pesos 20 a30kg maiores acima de suas cabeças.  É verdade que o peso sobe apenas até os ombros no arremesso, para depois ser lançado, mas por que então os levantadores não abrem a pegada o máximo possível após assentar a barra sobre os ombros para diminuir a distancia que o peso terá que subir?

Porque a maior parte dos iniciantes realiza a barra fixa com mais facilidade com a pegada na largura dos ombros; apesar do maior percurso, do que com a pegada aberta?

Por que se observa o mesmo no desenvolvimento de ombros com barra?

Por que pegar com a abertura máxima não é uma constante nos campeonatos de supino sem camisa de força, havendo inclusive atletas que fazem quase um tríceps supinado?

Finalmente, por que todos os powerlifters do mundo não fazem sumo?

O levantamento sumo, reduz o ângulo de flexão em praticamente todas as articulações envolvidas no gesto, dependendo da abertura da base e de quanto o atleta decide “agachar” no movimento. O que num primeiro instante só nos faz pensar em vantagem, no entanto esses ângulos diminuídos, em alguns indivíduos podem...

1-      ...Não oferecer a melhor relação tensão comprimento nos sarcomeros para uma produção máxima de força, e/ou:
2-      Atletas mais altos podem embaraçar-se com as próprias pernas, lutando para manter o quadril abduzido e os joelhos fora do caminho da barra;
3-      Atletas muito pesados por outro lado, podem ter dificuldade em agachar até  a barra , e ao mesmo tempo manter seu centro de gravidade próximo o bastante dela!

A relação tensão comprimento é uma discussão fisiológica que pode caminhar para a abstração, mas as questões 1 e 2 eu observo no dia a dia...

Falando mais de vivencia e menos de ciência, minhas percepções são:

No terra convencional, muitos atletas no auge da adrenalina, apenas colam a barra nas canelas, abaixam e puxam. O quanto o trabalho será dividido entre quadríceps e lombares, acaba sendo secundário, com tanto que a barra esteja colada no centro de gravidade...  Alguns dos terras mais pesados do mundo são feitos bem “stiffados”.  A força bruta pode nessa circunstancia ajudar muito. Esses mesmo atletas no entanto, teriam dificuldade em finalizar o primeiro tempo de um arremesso nessa posição. É tudo muito intuitivo. O atleta automaticamente adota uma base entre a largura dos ombros e quadril; é obrigado a dobrar um pouco os joelhos porque todos temos posteriores de coxa encurtados; e a essas alturas todo mundo já gritou no ouvido dele: “cola a barra na canela”... e resto é abaixar e puxar, simples assim!

O sumo em contrapartida, é um movimento mais técnico, e requer muito mais precisão e consciência corporal. Digo isso de cadeira, pois competi alguns anos no estilo convencional! O atleta tem de estar atento a muitas sutilezas no movimento:
1-      O quanto os pés devem voltar-se para fora...
2-      O quanto afastados devem estar...
3-      O quanto abaixar o quadril para conseguir a contribuição perfeita dos membros inferiores sem tirar totalmente o trabalho dos lombares; ou seja : sem transformar o movimento num agachamento com a barra nas mãos...
4-      O quanto conseguimos trazer os ombros sobre a barra antes do início do movimento...
5-      Manter o quadril o suficientemente aberto/abduzido (joelhos afastados) de forma que as coxas não bloqueiem os braços...
6-      Como manter a lombar arqueada sem empurrar todo o quadril muito para baixo ou as escapulas muito para cima da barra no outro extremo...
7-      FAZER TODOS ESSES AJUSTES EM UMA BASE MUITO MAIS INSTÁVEL, DEVIDO A ROTAÇÃO EXTERNA DO QUADRIL, COM OS PÉS APONTANDO PARA FORA...


E afinal? Qual o melhor estilo? O mais técnico ou o mais bruto?
Aquele em que você levantar mais peso e te der chances de subir ao pódio, simples assim!


... pra quem não sabia, Ed Coan com 350kg em estilo convencional. Coan, mesmo quando competindo em estilo sumo, utilizava esse movimento como parte da preparação, reservando o sumo apenas para as ultimas semanas.Foto do mundial da IPF de 1995.